Por José Joaquin López - anecdotario.net
Uma sexta-feira cansado depois de uma semana de trabalho no escritório fui buscar minha esposa. Havia um transito intenso e eu tinha dor de cabeça. Estacionei na rua em frente ao prédio onde ela trabalhava e apenas distingui seu uniforme e sua silhueta enquanto abria a porta do passageiro. Entrou, nos cumprimentamos com um olá e arranquei. Estava tão exausto que me pareceu que era uma sombra que tinha entrado. Ela disse que estava muito cansada. Trinta minutos depois o celular tocou; era o número de minha esposa. Foi então que me dei conta que não era minha esposa quem estava comigo.
A primeira coisa que pensei quando vi o número era que o telefone estava com defeito. Então eu me virei para o banco do passageiro e vi uma mulher dormindo que não era minha esposa. Eu não tinha ideia de quem ela era. Atendi o celular e minha esposa disse que estava me esperando. Não podia dizer que tinha se enganado e agora levava uma outra pessoa no carro, assim disse que estava indo pra casa porque estava com dor de cabeça e pedi desculpas. Ela disse algo que eu não me lembro e desligou chateada.
Depois de desligar o telefone, eu ri. A mulher que me acompanhava não parecia ser perigosa e percebi que ela também tinha confundido meu carro com o de seu namorado ou marido. Eu a vi dormindo tão pacificamente que não quis acorda-la. A surpresa curou minha dor de cabeça e a fadiga. Eu se virei para ver ela dormindo de lado e ri sozinho. Eu tinha ouvido falar de pessoas que se esquecem de seu parceiro em um posto de gasolina, mas nunca vi se confundirem assim.
A passageira desconhecida era uma mulher de vinte e poucos anos, cabelo longo e sobrancelhas espessas, magra e alta, como minha esposa. Ela acordou assustada, como se acordada de um pesadelo. Ela me perguntou quem eu era, o que eu queria com ela e o que tinha acontecido. Pedi-lhe que se acalmasse, que respirasse fundo e que me ouvisse. Quando o fez ela entendeu tudo, e começou a rir e por um momento nós dois riamos sem parar. “Mas que tonta eu sou!” dizia entre gargalhadas. “Que tonta!”
O nome dela era Andréa e trabalhava na mesma empresa de minha esposa, embora disse não conhecê-la. O namorado dela tinha um carro muito semelhante ao meu e subiu como fazia todos os dias, sem levar em conta os detalhes. Ela também teve uma semana muito puxada no trabalho. Sua casa ficava no caminho, assim decidimos que já que estávamos no itinerário eu a deixaria em casa. Se mostrou ser uma mulher simpática. Nos dois concordamos que a situação era muito engraçada. Ligou para seu namorado e disse que uma amiga tinha-lhe dado carona e tinha aproveitado. O namorado ficou chateado porque estava esperando em frente ao prédio onde eu a tinha levado. Tinha ligado pra ela várias vezes mas ela não atendia. Estava com o celular na bolsa no modo vibrador.
O transito estava muito congestionado. Depois de uma hora e meia deixamos de avançar e o transito parou totalmente. Já era noite. Os motoristas desligaram o motor e desceram do carro para esticar as pernas. O rádio noticiava que tinha ocorrido pelo menos dois acidentes graves e outros menores, que a situação era inédita na cidade. Um policial de transito passou de moto dizendo por um alto falante que tivéssemos paciência, que pelo menos levaria duas horas para que a situação começasse a melhorar.
Do lado de meu carro havia um grupo de jovens universitários em uma caminhoneta agrícola. Alguns deles eram músicos que iam a uma festa. Pegaram suas guitarras e bateria e formou-se um pequeno grupo de gente. Não sei de onde saíram as cervejas que foram entregues para quem estava ali. Uma perua que ia a um evento colocou à venda a comida que levava, sabendo que não chegaria a seu destino em bom estado. Em geral nos estávamos levando numa boa aquele extraordinário congestionamento.
Soube que Andrea tinha vindo do interior para estudar na universidade da capital e que suas metas eram viajar algum dia para Paris, ter uma família, uma casa muito grande e um emprego com ótimo salario. Era uma mulher determinada, sonhadora e ingênua, como frequentemente somos aos vinte anos. Seu namorado estudava com ela na universidade nos finais de semana. Moravam juntos e pensavam em se casarem. Eu não lhe disse que o mais provável era que daqui a dez anos ela não tivesse mais tantos sonhos. Gostaria que ela tivesse êxito e que todo esse êxito fosse tal como ela havia imaginado.
O grupo formado eram de jovens de vinte anos, só os da comida e eu tínhamos mais de trinta. Cantavam com entusiasmo, dava gosto vê-los cantar. Andrea estava contente e em algum momento daquela noite me puxou para dançar. O grupo cresceu quando começamos a dançar. De repente o transito engarrafado tinha se transformado em uma pequena festa.
Ficamos quase três horas dançando, cantando e bebendo cerveja. Então eu dei uma de músico desafinado e cantei algumas músicas que eu sabia na guitarra. Apenas quando a cerveja acabou, um guarda de transito passou de moto falando pelo alto-falante que em instantes o transito voltaria a ficar normal, que voltássemos para nossos carros. Nos despedimos de nossos novos amigos, não sem antes trocarmos os números de telefone e prometer que nos se encontraríamos de novo para repetir a festa em outro lugar. E, claro, nunca repetimos.
Como foi legal, não foi? disse Andrea quando entramos no carro e começamos a avançar. Liguei o rádio e ela dançava feliz no banco do passageiro. Eu a deixei em sua casa e concordamos não contar a seu namorado nem minha esposa o que havia acontecido. A minha esposa eu disse que tinha tomado duas cervejas e que tinha dormido todo o engarrafamento.
Pouco tempo depois, houve uma celebração para o aniversário da empresa na qual minha esposa trabalhava. Fui convidado. Eu fui na esperança de encontrar novamente com Andrea. Eu a vi no saguão do hotel onde a festa foi realizada. Ela me disse que um dia viu meu carro estacionado em frente ao prédio e ficou tentada a entrar novamente. Concordamos com um sorriso de que foi melhor que não tivesse feito.
Não voltei a ver Andrea. Agora tenho cuidado em verificar que seja realmente a minha esposa que entra no meu carro.

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